domingo, 26 de abril de 2009

Saudade, esse sentimento condenável...

As palavras dela e de outros poetas entraram pelos meus olhos
falavam de amor e saudade
de cheiros de flores ao longo da tarde
de presenças de risos e abraços
do sabor de agradáveis guloseimas e quitutes
enfim, coisas que ficaram lá pra trás...
Hoje minha vida está fadada a ser essa lacuna
essa falta das coisas que foram embora
não voltam mais, senão nos flashbacks de algum sonho.

Então a saudade ficam sendo aquelas flores que plantamos um dia
no jardim do sentimento
e o passar do tempo nos faz colher uma a uma
todas as lembranças
que se tornam então o antídoto
para essa profunda tristeza
sem nome.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Mais uma vez saudade

Saudade enlouquece a gente, baby
já posso ver ao longe a ambulância
os homens cruéis e insensíveis
de jalecos superbrancos
vindo nessa direção
já posso ouvir a sirene...
a ambulância se aproxima
e o pesadelo só está começando.

Natureza morta

Cachorro
focinho
derretido
na tela da mente
foi a tinta fresca
escorrendo da tela
foi uma invenção
que não terminou de ser inventada
foi abortada
nunca nasceu
o cachorro e seu focinho
não vão correr pelo campo verde
porque nem foram pintados:
a vontade do artista era só dormir.
Quisera levantar um dia
e descobrir que meu tédio
está condenado à execução
condenado a um terrível esquecimento
condenado a ficar cego e a mendigar sob os viadutos
enquanto eu posso abraçar
os amigos e os amores dessa minha vida
e brincar nas marolas que vem e vão
morninhas no fim da tarde
no mar daquela cidade.

Atalho para o pomar

Toda boa goiaba está bichada
vejo isto com meus olhos ardendo
secos de nunca mais terem visto o mar
Toda boa goiaba está bichada
a realidade nua e crua está podre
e não digeri muito bem
o sumo amargo que a vida-lima me trouxe
são dias difíceis, baby
as boas e as más goiabas
no cesto descansam
misturadas como se fossem
amigas de infância
eu, você, nós todos
somos as goiabas brancas
deitadas umas sobre as outras
e quem come nunca poderá
só com o olhar
distinguir as boas das más goiabas.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Destino de galinha

Fico pensando na vida triste das galinhas. Elas nascem para botar ovos e virar comida nos pratos dos homens ao meio-dia. Ou então, gloriosas, compõem a ceia natalina. Galinha nasce pinto e não tem muito futuro pela frente: cisca o chão debilmente, para catar milho, minhocas e pedras. Seu olhar é sempre ansioso, tudo é surpresa e susto no olhar da galinha. Ela não sabe o que é tédio, porque nunca ninguém ensinou. Galinha, como todos nós, morre qualquer dia desses. Nunca vi galinha velha, todas as que conheci deixaram este mundo cedo demais. Todas morreram jovens e nenhuma teve consciência do próprio destino. Na infância, os homens criam cães e gatos e até periquitos a quem chamam de amigos. Mas galinha está relegada ao terreiro: se põe bons ovos, é preservada da morte prematura. Galinha quase sempre morre assassinada. "É por uma causa maior", dizem as visionárias. No céu das galinhas ninguém vira almoço e só botam ovos quando querem. Mas até lá elas estão condenadas a desconhecer o porvir.

Poema sem propósito

Noite negra no teto do horizonte
a pequena vila dorme
e eu também caio na cama
pra dormir meu sono
que é mistura de cansaço e tédio


minúsculas estrelas cintilam neste céu
como romeiros em vigília
de tempo pascal


a manhã vai despertar os frangos no terreiro
e os frangos por sua vez
vão acordar a vila inteira



mais uma vez o sol desponta
e clareia o dia
e encerra o sossego
e tudo recomeça.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Temporada em Piritiba

Uma vida besta. O canto galináceo rompe as manhãs e de dentro das cloacas brota o milagre de mais uma refeição matutina, quando não gora. Você há de ver o poeirão levantado pelo correr das locomotivas do sertão - são carros, ônibus e caminhões que vão e vem e nunca sossegam. Você há de ouvir o murmúrio das primeiras notícias da manhã na boca das donas de casa que varrem as calçadas e há de me dar razão: elas sempre sabem do nosso destino cotidiano antes de nós. Tampas de panelas abafam o aroma dos quitutes de daqui a pouco. Daqui pras nove horas vai esquentar como já fosse meio-dia. Fast-food não há. Delivery não há. Todos os comércios fecham para o almoço. Há saudade do mar constante no meu coração como teias de aranha nas lombadas de livros esquecidos nas estantes.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Considerações sobre a madrugada

Meu estômago está roncando. Esta noite me vejo inspirada pela lembrança dos olhos teus na contramão dos meus. Olhávamos para a mesma coisa: nós, que não sabemos fingir nada. Ou quase nada. Meu estômago volta a roncar. Porque é tarde da noite e todos dormem. É hora de assaltar a geladeira e encontrar dentro uma fruta velha e esquecida, mas ainda digna de ser comida. Lembro que não há carambolas. Há apenas mamão e bananas. E nem um nem outras me apetecem. Queria morder uma fruta com sumo, frutessência.
Baby, nunca adivinhei que quando meus olhos encontrassem tua cara isso me faria mais inteira e mais feliz. Nem atinei de alertar ao meu coração do perigo que sempre se corre quando se encontra a Beleza. É que eu sou, Baby, tão distraída! A timidez me faz parecer uma grande palhaça. A minha timidez fode, desastra com tudo que eu planejava te dizer, te tocar. Ou simplesmente apenas te olhar. Olhar de frente, como o pescador que já não se embriaga do azul do mar porque o vê todas as manhãs. Mas não...tua presença não é nem nunca será uma rotina pros meus olhos míopes de banalidades. Teus olhos são cheios de novidades.
O teu sorriso coloca um sol na sombra da meia-noite
e eu queria esse sorriso pra mim
uma vez que fosse
como coisa dada
de uma para outra pessoa querida
um presente teu pra mim
se eu merecesse
O teu sorriso é flor e é estrela
flor que não se colhe
estrela que com as mãos não alcanço
mas está sempre perto
está mesmo dentro dos meus olhos
e volto este olhar pra você
pedindo um sorriso seu
pra afagar minha vida
pra fazer meu dia nascer feliz.

(inspirada por Cazuza na noite de 02/04/2009.)
O mar é tão verde e azul
e essa saudade dele me põe tão comovida, meu bem, tão comovida...
e lágrimas recatadas de um pranto recolhido escorrem desajeitadas pelo meu rosto
porque hoje minha paisagem são cavalos e jumentos a cagar pelo passeio e pelo asfalto
sem a menor cerimônia
sem a menor elegância.